Recomendado por amigos peguei nesta peça que tinha mas não lera. Tinha-a comprado num alfarrabista e aguardava-me a surpresa de uma escrita incrível, dilemas a sério, uma resistência (literal e figurada) e pela primeira vez que eu tenha lido em teatro um olhar crítico sobre todos os lados políticos.
Numa edição deliciosamente antiguinha da Europa-América (e tradução de António Coimbra Martins, que traduz algumas outras da peças de Sartre na mesma editora).
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Saturday, May 28, 2011
Livro do Dia: As Mãos Sujas, de Jean-Paul Sartre
Thursday, May 26, 2011
Livro do Dia: Novos Rumos do Teatro
Este livro é especial:
Não só é especial por falar de novos rumos (que o eram na altura da sua edição em 1979) como foi o primeiro livro sobre teatro que li. Falar de Living Theatre, Teatro total, Pan pânico para um jovenzito foi uma surpresa.
Para que se veja a actualidade (e especialidade) deste livro no fim constam várias definições do vocabulário, entre as quais Biomecânica: "Conceito da arte de interpretar criada por V.E. Meyerhold (1874-1940) que rechaça o naturalismo e a atuação psicológica do método de Stanislavski. Os exercícios biomecânicos acentuam a interpretação exterior, física, quase acrobática, na ideia de que o actor deve ser um virtuoso do instrumento que é seu corpo."
Como dar cabo da performance de um poema?
Ontem vi darem cabo de um poema.
Não pelos motivos habituais (entoações ingénuas, falta de interpretação, ignorância da estrutura em versos...) não, foi depois.
O poema estava bem dito, bastante bem dito até. Mas a rapariga que o disse só o sabia dizer mas não sabia controlar o momento teatral em que estava: no fim, acabado o poema, com os justos aplausos, tomada pela emoção (ou por um pudor, ou até altivez) virou a cara aos aplausos.
O poema ficava destruído por aquele gesto. Porque afinal aplaudíamos para nada, a intérprete não aceitava. Eu parei imediatamente. Por muito bom que tivesse sido nunca poderia haver (uma recusa) senão uma aceitação de "eu fiz isto e acredito no que fiz, julguem-me como quiserem, este é o meu peito".
Nunca tinha pensado nisto e, portanto, mais ou menos altiva, agradeço-lhe.
Wednesday, May 25, 2011
Como é a pedagogia de Guennadi Bogdanov?
Guennadi Bogdanov ao preparar o aluno/actor usa uma pedagogia muito simples e eficaz: dá tarefas e tempo (esperando).
O aluno/actor bate com a cabeça na parede durante o tempo necessário, autonomamente vai batendo mais com a cabeça na parede até resolver o exercício - sua tarefa. Sem explicações senão qual a tarefa.
O que dá isto?
Dá crescimento. O aluno/actor descobre como se faz. Assim como o encenador que pede ao actor para fazer algo e o actor trabalha dentro de si como o fazer.
Os alunos hábeis resolvem rapidamente, os menos hábeis (ou os que pensam ser impossível a tarefa) olham em volta e aprendem vendo os melhores. Sem explicações, só inteligência, ou do corpo ou do olhar que procura respostas.
Com Bogdanov os alunos aprendem, não são ensinados*.
*Isto vale sobretudo para a preparação, o chamado treino - aprendizagem do seu corpo e da sua organização - que antecede a técnica e os princípios técnicos da Biomecânica. Que estes são explicados e transmitidos com uma aplitude de conceitos verdadeiramente estarrecedora.
Como é estudar com Guennadi Bogdanov?
Guennadi (ou Gennadi) Bogdanov é um professor de biomecânica, ou mais especificamente da Biomecânica Teatral de Meierhold (ou Meyerhold, ou até Mejerchol´d).
Estudar com ele é simultaneamente duro e gratificante. É duro não pelos exercícios exigentes (sejam de coordenação, força, equilibrio, ritmo, precisão e até improvisação) mas porque ele não diz como os resolver. Pois é de soluções que passam pelo corpo que se trata: como encontrar o caminho ou as ligações para resolver aquele problema motor?. Esta é a parte dura e gratificante também - porque o que se aprende aprende-se. E sai-se sempre de uma formação com ele de modo diverso, melhor que antes - porque se resolveu mais coisas, e essas coisas inevitavelmente ficam connosco, diminuindo os nossos limites.
E tudo o que ele dá tem uma ligação directa com o trabalho do actor, tudo é uma imaginativa abordagem para se ultrapassar os limites, não abstractamente mas em patamares da nossa biomecânica - que não é como a do corredor, ou do ginasta, ou até do malbarista, mas lá vai beber. Sobretudo difere pois o actor mostra, não executa somente para um resultado eficiente. Mostra. E é nisto que Bogdanov insiste e se apoia.
Tuesday, May 24, 2011
O fim do pastoreio?
Há dias escrevi uma espécie de conclusão para o que andava fazendo. E esse género de implicação nas coisas de facto para mim acabou. Seja em aulas seja no blog (que afinal continua, mas de modo diferente).
Dou-vos um exemplo de como as coisas agora são impeditivas: tenho x alunos de teatro (a quem isto deveria dizer muito respeito), normalmente vêm à aula 50 ou 60% desses alunos. Cada um deles paga pelo curso tanto quanto pago eu por um doutoramento. Chegam muitas vezes às pinguinhas, atrasados, tanto para o início da aula, como depois do (enorme) intervalo, têm necessidade de sair mais cedo (sempre), ou às vezes de não vir ao uma segunda parte da aula. Apesar de cada um deles pagar tanto quanto pago eu por um doutoramento. No meio disto tudo é uma fantasia falar da capacidade indispensável do actor se conter, que é assim que começa a arte do actor, pois ele é o seu material.
No meio disto tudo ir falando de coisas e ir dando a experimentar coisas é uma evolução extraordinariamente lenta: recomeçando cada semana, às vezes recomeçando a cada parte da aula. Não admira que até agora ninguém tenha ido a Itália ter tido aulas com Bogdanov além de mim - ninguém está preparado, nem para aí virado. Essa é a escala em que trabalho. Estamos todos ainda no nível dos workshops ligeiros. A cada semana recomeço, uns centímetros mais adiante somente. É claro que com a taxa de atrasos e faltas em alguns casos é recomeçar do quase zero - porque algum aluno se lembrou de não aparecer quando as regras estavam a ser ou explicadas ou assimiladas.
A minha professora Polina Klimovitskaia dizia que dava aulas para quem lá estava. Eu tenho repetido essas mesmas palavras. Mas a verdade é que arrelia. Arrelia olhar para uma turma e estarem menos 7 ou 8 alunos. Arrelia ouvir o recado de que "fulano ou fulana vai chegar atrasado/a", arrelia explicar aos alunos que numa aula de quatro horas se por acaso não vêm à segunda parte não posso considerar a sua presença. Arrelia e a culpa de me arreliar é só minha. Arrelia mas a responsabilidade apesar de tudo não é dos pais, da escola ou da geração: é de cada um dos alunos. De cada um deles porque cada um é responsável pelos seus actos. E só encarando-os assim se pode ministrar um ensino de responsabilidade.
Agora voltando ao pastoreio: sei de facto que agora sei mais coisas do que quando comecei a dar aulas, sei de facto que agora sei muitas mais coisas do que quando comecei a estudar, sei até que sei mais coisas que muitos dos meus professores. Sei técnicas, conheço princípios e domino como criador muitas coisas. Isto adianta alguma coisa nos tempos que correm? Se vocês tiverem uma taxa de faltas de 50 ou 40% esse conhecimento, esse pastoreio vai por água abaixo porque na verdade se aprende em grupo fruto da responsabilidade individual. Porque a falta não é apenas do corpo, mas da atenção. Ou arranjo maneira de os alunos estarem vigorosamente envolvidos em alguma tarefa ou instala-se o tédio, os corpos começam a vergar-se, a querer sentar-se. Isto é primário. Aceito isto numa primeira aula, depois não.
Portanto o que sei (e disse que sei) serve às pinguinhas e às pinguinhas vamos avançando. Um dia pastoreio um grupo, no outro dia é outro grupo. Avanço pouquinho e eles avançam pouquinho, pagando 10 vezes mais que o que eu pago em Itália para eu avançar 10 vezes mais.
A vida é assim. Percebo que eu como criador sou uma coisa aparte do que sou como professor, que o que adquiri como actor serve só um pouquinho o que devo fazer adquirir como professor. Porque tudo tem que ser muito diluído. Como quando se dá algum bom nutriente a crianças se dilui de modo a ser mais digerível, ou agradável. Pouco a pouco. Porque não estão preparados.
Livro do Dia: Romance Teatral, de Mikail Bulgakov
Para quem conhece Bulgakov (Mikhail ou Mikail) de "Margarita e o Mestre" e se interessa por Stanislavski, Nemirovitch-Dantchenko e o Teatro de Arte de Moscovo este é o livro perfeito:

é de facto um pequeno romance, mas sabemos que não é completamente ficcional: aqui está uma descrição louca do interior do Teatro de Arte de Moscovo, das suas reuniões, processo de ensaios e toda uma hierarquia que Bulgakov tão bem soube descrever. O mesmo Bulgakov que lá esteve como dramaturgo (residente, diríamos agora) e mais tarde como director. Uma delícia. E em português.
Friday, May 20, 2011
"Pervertimento" de José Sanchis Sinisterra estreia hoje
Hoje e amanhã
Pervertimento
autor: José Sanchis Sinisterra
tradução: Rui Oliveira
direcção: Ana Saltão
interpretação: Ana Saltão, Nuno Meireles e Rui Oliveira
música e sonoplastia: Hugo Osga e João P. Jorge
operação luz e som: João P. Jorge
cenografia: Acaro
figurinos: Patrícia Afonso
duração aproximada: 1h 10min
bilhete: 2 euros
20 e 21 de Maio, Rua Álvares Cabral 372 Porto - Contagiarte - 22.30h
Livro do Dia: Il Servitore di Due Padroni, de Goldoni/Strehler
Um dia em Perugia (Itália) procurava numa pequena e óptima livraria qualquer coisa sobre Commedia dell´Arte e eis que encontro este volume da Einaudi: o video da produção do Piccolo Teatro di Milano, com encenação do Giorgio Strehler, e a peça em livro também.
o video:
o livro:
Thursday, May 19, 2011
Livro do Dia: Meyerholds Biomechanik, de Jörg Bochow
Este livro é um importante estudo sobre a Biomecânica, fala do seu aparecimento, dos seus princípios, tem listas das acções dos vários Ètudes, o seu autor estudou com Guennadi Bogdanov. Está publicado em alemão.
nota: a fotografia da capa é de Nikolai Kustov, o professor de Guennadi Bogdanov. Esta e outras fotografias de Kustov foram levadas da U.R.S.S. para os E.U.A. por Lee Strasberg, em circunstâncias que desconhecemos.
Tuesday, May 17, 2011
Livro do dia: L´Attore Biomeccanico
Para todos os que se interessam por Meierhold (ou Mejercho´d na transcrição italiana) e pela Biomecânica aqui está um texto que reúne o que Meierhold terá dito e escrito sobre a técnica. Não é muito (o que foi dito ou escrito por ele) e é disperso mas serve de referência*.
Vem com uma óptima introdução de Fausto Malcovati - um dos mais fortes impulsionadores da cultura teatral russa em Itália - e vem também com um estudo extenso de Nicolaj Pesocinskij (Nikolai Pesoschinski na nossa transcrição) sobre a história da Biomecânica sob Meierhold.
*Os textos existentes são dispersos, no entanto a Biomecânica existe e muito concreta, como? por um desenvolvimento dinâmico que não tem parado e que se transmite oralmente, como podemos observar pelo pormenor a que chega Guennadi Bogdanov.
Monday, May 9, 2011
Livro do Dia: Se Questo È Un Uomo
Para quem conhece o livro de Primo Levi "Se isto é um homem":
esta é a adaptação que o próprio Primo Levi e Pieralberto Marché fizeram do livro, e digo-vos aqui vemos como o teatro, porque as coisas acontecem à nossa frente, sem explicação, pode ser poderoso e perturbador.
Não tenho notícia de alguma vez ter sido feito em Portugal.
Friday, May 6, 2011
Monday, May 2, 2011
O fim do pastoreio
Dou aulas regularmente há sete anos, pouco mais ou menos. Os sete anos que Jacob serviu de pastor, por amor a Raquel. Antes disso recebi-as. Fiz um curso de formação de actores quando a escola se estava a formar e com ela formei-me (ou formaram-me) também. Deu lastro, alguns nomes que fiquei a conhecer, duas e meia experiências positivas de crescimento e de resto uma gigantesca falência que procurei suprir em mim como actor nos anos que se lhe seguiram. Até aos dias de hoje.
Quando comecei a dar aulas perseguiu-me a ideia de fraude e desconsolo artistico e técnico que senti e sentia. Procurei literalmente dar o que tinha descoberto que não me tinham dado. Edipianamente procurava resolver a história, sendo atormentado por ela.
Sete anos passaram em que pastoreei muitas ovelhas, alunos candidatos a actores. Pastoreei muitas projecções de mim mesmo que começava a estudar. Foram estes anos todos e no meu balanço foram anos inúteis. Por duas razões:
porque eu estava errado cosmicamente, dado que a minha experiência passou e agora sou o que sou, com a minha construção
porque de facto, proporcionalmente, o que resultou destes anos de magistério não é conta justa
Neste esforço de pastor criei este blogue, que servia para falar de coisas num local onde ninguém fala de coisa nenhuma. Ninguém quer de facto saber. Itália, USA/UK, Espanha têm traduções do Stanislavski e do Meierhold e nós estamos na idade da pedra. Ninguém quer saber. Os meus alunos não sabem que há uma biblioteca na sua escola e aqui eu pertenço a outro mundo. Ninguém aqui faz ideia do que é training, nem há nenhum (outro) português que frequente as formações de Guennadi Bogdanov que, com sete ou catorze anos a mais depois da minha formação vos digo que é muito superior a qualquer escola de teatro e eu conheço-as. Nada resultou como deveria. As aulas sairam furadas: se há alunos que falsificam presenças então não vale a pena falar de ética no teatro ou de training, se há alunos que faltam e estão na rua ou no café ou no facebook, então eu estou e estive a dar pérolas a porcos. Com uma agravante: o sonho do pastor.
O pastor conduz, mas não é conduzido (- em termos gerais, é claro). Para que os outros se alimentem, ele está atento e procura - para os outros. Não para si. Durante estes anos fi-lo em deterimento de um actor: eu próprio.
Agora, que concluo pelo fracasso que é também o fim das ilusões, concluo que esta fase, este propósito, este edipianismo, a escola que eu carregava, o deterimento de mim como actor, a exigência e até o choque, acabaram.
Este blogue não terá continuação. É agora, para mim, tão inútil como o esforço e o ideal que lhe deram origem.
Esta posição em relação ao mundo (divulgação, promoção, estímulo, produção e reflexão sobre as coisas teatrais) acabou. Assim como acaba e se conclui em breve a minha posição ou função em relação à formação do actor. Pretendo fazer disto algo muito menos regular, e muito menos presente. Estou cansado de ser pastor, falei demais, dei demais, esperei demais. E esqueci-me de mim, neste processo. Este tempo agora, necessariamente, acabou. Dei aliás o que tinha arranjado para mim, e fiquei sem nada. Agora é juntar o que tenha e dar essa atenção a mim, como criador.
De textos teóricos conto concluir a tese de doutoramento em preparação sobre uma experiência exemplar por que passei.
De resto despeço-me da terra dos sonhos. Agora é a minha vez de concretizar plenamente o meu sonho. Já sem passados estranhos ou futuros ideiais, só o momento presente em que Jacob corre para Raquel.

