Por volta de 1994 um grande grupo de estudantes manifestou-se frente à Assembleia da República. As propinas no ensino superior cresciam a olhos vistos. Na manifestação um rapaz mostrou o rabo. O director de um jornal que publicou fotografias desse rabo sintetizou esses estudantes (e a geração a que pertenciam) como "Geração Rasca". Era a primeira geração pós-25 de Abril.
Uma geração que tinha podido estudar e especializar-se, a quem eram abertas essas portas e muitas expectativas. Nascidos na década de 70 eram muito novos para ter vivido a ditadura, mas crescidos o suficiente para acompanhar Verão Quente, Camarate, Eanes, Auto-estradas, Centros Comerciais, Televisões e a Europa.
Essa geração, que mostrara o rabo, talvez nos anos 90 mal suspeitasse que lhe mostrariam o rabo também. Sucessivamente. A Universidade sobre a qual protestavam acabou quando os cursos foram concluídos, chegou a entrada no mercado de trabalho. Cerca de vinte anos passaram dessa manifestação e outra se convoca agora, para dia 12, da "Geração à rasca". Serão talvez os mesmos e os outros que vieram depois. Justifica-se esta manifestação?
Vou dar-vos uma medida pessoal do estado das coisas: entre as pessoas que conheço da minha idade ou semelhantes, 90% estão a recibo verde ou contratos sazonais, estão a trabalhar em áreas que não foram as da sua formação, vêem-se à rasca para pagar a segurança social cujo escalão mais baixo anda pelos cento e muitos euros. Muitos estão desempregados, apesar de todos terem formações superiores em diversas áreas e extensos currículos. Não têm direito a subsídio de desemprego, reforma, 13º mês, e - parece às vezes - sequer direito ao trabalho. São os precários.
Há uma geração atrás, aos 30, 35, 38 anos, as pessoas não andavam aos tombos assim. Vemos pela geração dos nossos pais que teriam começado pouco antes a assentar num emprego, talvez mal pago, talvez tremido, talvez duro, mas regular. As situações que vejo agora são mal pagas, tremidas, duras por vezes e sempre, mas sempre inconstantes.
Outra medida pessoal: o meu cv tem 8 páginas de actividade artística, docente e de formação recebida, estou a meio de um doutoramento, e disseram-me recentemente, nos dois sítios onde dou aulas, que se calhar "convém arranjar outra coisa". Nada importa, nada importou, os meus amigos têm tido como preocupação que país estrangeiro os pode acolher com trabalho aos trinta e muitos. Por uma série de motivos inexplicáveis, nós, que devíamos atingir agora o pico da nossa carreira, estamos constantemente a recomeçá-la.
Sócrates disse que "os jovens são os primeiros a ser afectados pela crise económica", ao responder ao episódio de Viseu. A tal crise económica começou há muito tempo para nós. Começou quando quisemos entrar no mercado de trabalho.
Este sábado muita gente, de muito lado, vai dizer que afinal existe, apesar de isto ser constantemente desmentido pela segurança social, pelas estatísticas do desemprego, pelas finanças, pelos empregadores e até mesmo pelo pudor.
Portanto, participar ou não na manifestação?
Home » Unlabelled » Geração à rasca: participar ou não na manifestação
Wednesday, March 9, 2011
Geração à rasca: participar ou não na manifestação
Lihat juga Artikel dari
Subscribe to:
Post Comments (Atom)

0 comments:
Post a Comment